Pequeno balanço eleitoral do primeiro turno em 2014

07/10/2014 13:05

Daniel Baptista

As eleições no Brasil que ocorreram no domingo dia 5 de outubro terão sua continuação dia 26 do mesmo mês, mas desta vez com apenas dois candidatos. Isto para presidência e para alguns estados da nossa federação. Como nós produzimos nossos escritos no estado que se localiza ao norte do Uruguai, nós vamos nos resignar ao ocorrido aqui e tentar problematizar a questão em âmbito nacional.

O resultado nas urnas no primeiro turno nas eleições presidenciais nos mostra que o Brasil polarizou-se de vez em duas vertentes que já ocorrem com uma certa frequência: PT versus PSDB. Dilma Roussef a partir de 2010 teve a difícil tarefa de continuar as políticas construídas oito anos antes por Lula, que mostraram-se satisfatórias nos setores sociais, econômico e no campo das relações internacionais. A candidata Petista durante o seu governo não contou com um elemento que se demonstraria decisivo nos dias de hoje, que no caso seria o crescimento econômico de boa parte da população, a chamada nova classe média. Sabemos que no Brasil a classe média quer privilégios, essa fatia da população que outrora foi pobre na década de 1990 e início dos anos 2000, foi cada vez mais sendo absorvida pelos valores que a classe média conserva. Isso é verificável nas redes sociais onde as campanhas anti PT cresceram espetacularmente nas manifestações de Junho do ano passado.

A história nos demonstra que os acontecimentos do passado, refletem no presente, neste caso de um passado recente. As manifestações que começaram em Porto Alegre contra o aumento da passagem e o colapso da estrutura oferecida aos usuários do transporte público, paulatinamente foram disseminando-se as demais regiões do Brasil e o que antes eram manifestos contra o transporte público, foram aparelhadas pela mídia hegemônica infiltrando pautas que encontram-se na agenda conservadora, quem lembra-se das declarações de Arnaldo Jabor um dia antes e um dia depois dos acontecimentos em São Paulo sabe do que se trata[1]. Isto ocorrido no ano passado seria decisivo nas eleições de 2014 como de fato os resultados nos mostram. É um ressurgimento da direita conservadora brasileira travestida com discursos que beiram a uma opereta tragicômica como por exemplo, a ameaça de um golpe comunista (?) que talvez seja possível no mundo de Minecraft.

Aécio Neves representando o PSDB possui o velho discurso liberal, o que promete corte de impostos, redução de juros, enxugamento da máquina pública e a seus gastos. Essas premissas políticas sempre vem acompanhadas de notícias que indicam que o mercado de bolsa de valores ficou estável ou subiu alguns décimos se concretizada a vitória do tucano. O que não passa de uma bobagem sinceramente, sabemos que esses supostos lucros ficaram concentrados nas mãos dos que monopolizam a riqueza. Talvez um bom trunfo para este segundo turno do candidato Aécio seja os grandes centros metropolitanos e sua velha e boa base de São Paulo, o maior colégio eleitoral do país, onde a maioria dos paulistas não sabe digitar outros números além do 45 (e diga-se de passagem, desta vez talvez eles consigam privatizar a USP). No demais é o velho discurso liberal abraçado até pela nova classe média, impulsionada pelo capital de consumo, via esta escolhida pelas políticas do PT que em um determinado momento não soube se renovar com as novas demandas e estagnou-se.

Quanto ao combate da corrupção (um tema amplamente explorado nos debates) ou a punição aos corruptos ainda é difícil esclarecer a população participante de nossa jovem democracia plena, que isso está intimamente ligado ao nosso modo de produção. Independente de qual coligação partidária rouba mais ou menos[2]. Para os mais raivosos se retorcerem, os candidatos opositores em nenhum momento falaram em acabar com o Bolsa família e os demais programas de políticas sociais criadas e ampliadas na gestão do PT, sabem que isto seria um tiro no pé e que também, estas políticas são governamentais e não partidárias.

Para o segundo turno resta ver quem saíra vencedor. Se Aécio ganhar, podemos ter uma breve previsão de que podemos perder avanços importantes para o país, especialmente no campo das relações internacionais, onde o protagonismo crescente de nossa diplomacia e a consolidação cada vez maior do BRICS poderá estagnar (para quem não leu recomendo os artigos sobre o assunto do colega Marcos Belmonte[3]). Sabemos que os tucanos preferem Washington. Caso Dilma sair reeleita, é necessário que sua cúpula mude radicalmente seus planos traçados para os próximos anos, mas isso ficará difícil com uma bancada composta em sua maioria pela nata do conservadorismo brasileiro, o diálogo e a paciência de um xadrezista serão essenciais.

Quem mais “queimou-se” neste pleito eleitoral foi Marina Silva. Com trocas de siglas vexatórias, declarações e direções que nunca ficaram claras, a candidata sai mais desgastada possível deste embate. Se eu fosse Marina, demitiria todos os assessores e marqueteiros políticos envolvidos na campanha para sempre. É bem verdade que seus votos no primeiro turno serão decisivos no segundo, ao contrário da eleição de 2010 onde a candidata preferiu a neutralidade, mais uma vez contrariando-se, desta vez ela terá que posicionar-se largando de mão o seu discurso anti polarização. Uma agradável surpresa neste cenário de 2014 é Luciana Genro. A candidata tocou insistentemente em assuntos que incomodam o conservador que habita em nossas almas como o casamento civil entre homossexuais, descriminalização da maconha e do aborto e taxação das grandes fortunas. Políticas estas que infelizmente, nunca avançaram devido ao crescente aumento da bancada evangélica no congresso. Mas o saldo é positivo mostrando que é possível uma renovação do discurso da esquerda, mesmo com um pouco mais de um milhão de votos.

No estado mais politizado do Brasil como orgulhosamente nos auto-outorgamos, algumas definições demonstram isso. A eleição de Carlos Heinze do PP – aquele que segundo o próprio, lésbicas, gays, índios e quilombolas são tudo que não presta - para deputado federal nos evidencia que a muitos Km de Porto Alegre, ainda impera o mais tenro e puro coronelismo latifundiário do século XIX. Aberrações como a eleição de Jardel (ex-jogador e que faz Tiririca parecer o maior intelectual brasileiro do século XXI) para a bancada estadual, o sujeito que é de direita (mas preferia ser de cabeça) porque é uma pessoa do bem, correta, direita, demonstram a sapiência política gaudéria vestida de bombachas, lenço e alpargatas.

Para o senado todo o carisma de Olívio Dutra não foi o suficiente para derrotar o candidato do maior partido político do Rio Grande, o PRBS (Partido Rede Brasil Sul).  Os Sirotsky’s com Lasier Martins e a sua longa jornada como funcionário do grupo midiático gaúcho saíram vitoriosos. Mas não houve facilidades como as pesquisas mostraram. Como em uma corrida de cavalos, o candidato da RBS ganhou na reta final por uma cabeça de diferença. Disto podemos tirar uma conclusão, que é sim necessário e urgente quebrar como monopólio midiático e regulamentá-lo, se quisermos de fato uma mídia livre e democrática. Esta mesma RBS afundou a sua candidata ao palácio Piratini ao não saber guardar segredos do passado. Contrariando todos os prognósticos das pesquisas, Ana Amélia afundou-se junto com o seu cargo comissionado exercido em 1986, sem nenhum dia de trabalho exercido, mostrando que questões de cunho moralista ainda pesam nas urnas.

Para o governo do estado restou o segundo turno a ser disputado por Tarso Genro do PT e Ivo Sartori do PMDB. Com uma eleição muito parecida como pleito de 2002, onde na ocasião o mesmo Tarso Genro e Antônio Brito estapeavam-se, Germano Rigotto avançou para o segundo turno e saiu o grande vencedor na época. Com carisma e um discurso semelhante ao de Rigotto, Sartori arranca muito bem para o segundo turno devido ao seu bom desempenho no primeiro enquanto Tarso tem o estigma de carregar questões como o não cumprimento do pagamento do piso aos professores e claro, de ser da base do governo federal, este desgastado por um aumento no discurso anti PT, aliado a uma tradição típica do Rio Grande: a de nunca reeleger um governador, se o conseguir será um feito histórico.

Vamos ver para onde vão evoluir os debates, os acontecimentos paralelos e aguardar o dia 26, vamos aguardar qual o rumo que a maioria vai escolher nos próximos quatro anos e depois sim, começar de novo um novo pleito em 2018 que é de importância ímpar para a nossa jovem democracia que me parece, consolidar-se (ainda bem) cada vez mais.

Notas

[1] Boca para sorrir e dentes para morder: o Movimento do Passe Livre e seus algozes. Davenir Viganon para O Fato e a História. Disponivel em: https://ofatoeahistoria.webnode.com/news/boca-para-sorrir-e-dentes-para-morder-o-mpl-e-seus-algozes/ Leia também: https://ofatoeahistoria.webnode.com/especiais/protestos-no-brasil/

[2] O fraco é o corrupto. Vinícius Siqueira do Colunas Tortas para O Fato e a História. Disponivel em: https://ofatoeahistoria.webnode.com/news/o-fraco-e-o-corrupto-/

[3] Lá denovo e aqui outra vez. Disponivel em: https://goo.gl/Cgbb2S ; BRICS como um contrapeso a hegemonia do norte e suas possibilidades. Disponivel em: https://ofatoeahistoria.webnode.com/news/o-brics-como-contrapeso-%c3%a0-hegemonia-do-norte-e-suas-possibilidades/ ; Sobre alguns pontos da Declaração de Fortaleza na VI cúpula do BRICS Parte 1 disponivel em: https://ofatoeahistoria.webnode.com/news/sobre-alguns-pontos-da-declara%c3%a7%c3%a3o-de-fortaleza-na-vi-cupula-dos-brics-parte-1/ e parte 2 disponivel em: https://ofatoeahistoria.webnode.com/news/sobre-alguns-pontos-da-declara%c3%a7%c3%a3o-de-fortaleza-na-vi-cupula-dos-brics-%e2%80%93-parte-2/ . Todos escritos por Marcos Belmonte para O Fato e a História.

 

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