Viva Tom Zé, fora Coca-Cola
04/10/2012 08:35Rodrigo Hermano
No dia 3 de outubro de 2012 fui a um show do Tom Zé no recém reinaugurado Auditório Araújo Vianna, em Porto Alegre. Mas ao contrário do Segundo Caderno, não vim falar da magnífica performance de Tom Zé, nem fazer fofocas de celebridades. Este show é uma grande oportunidade de discutir diversos problemas atuais de nossa cidade e relacioná-los. Como vou relacionar um show no Araújo Vianna com alguns impasses que ocorrem em Porto Alegre?
Quem chega no Araújo Vianna para assistir um show se depara com uma enorme lata de Coca-Cola inflável em frente ao auditório. Quem passa pelo largo Glênio Peres precisa desviar de uma placa da Coca-Cola. Mais adiante um enorme mascote da Copa do Mundo com uma camisa da Coca-Cola. Chego a cogitar uma futura mudança no nome da cidade para “Espaço Porto Alegre - Coca-Cola”. Me falaram que, na Usina do Gasômetro, a onda é a concorrente Pepsi (ainda não fui lá conferir, posso estar errado). Talvez isso tenha um sentido mais simbólico, pela cor do refrigerante e sua semelhança com a cor da água do Guaíba. Talvez no verão, uma possibilidade é que tenhamos a orla patrocinada pela soda-limonada, por conta das algas verdes e fedorentas que brotam de nossas torneiras.
Durante a apresentação do Tom Zé, assim como no show de inauguração do Araújo Vianna, que também prestigiei algumas semanas atrás, as manifestações estavam presentes. Os gritos de “abaixo Coca-Cola”, “Ei, OPUS, vai para aquele lugar” e outros direcionados ao Zaffari, à RBS e a todos que estão exaltando essa invasão empresarial aos espaços de nossa cidade. Hoje, no Tom Zé, levaram até cartazes denunciando a situação de nossos espaços públicos de vivência. Claro que muita gente entrou na onda com propósitos eleitoreiros, escutei hoje alguns gritos inéditos de “fora Fortunatti”. Mas isso não interessa tanto, a questão das privatizações é urgente e todo aquele que se colocar em uma posição de resistência é importante. A eleição municipal deste ano em Porto Alegre já nasceu podre. E isso tem relação com os planos do empresariado para nossa cidade. Estes estão, inclusive, sendo executados com pressão popular. Os jornais estão a fazer benefícios aos seus patrocinadores todos os dias, falando do quanto as obras andam atrasadas e incitando-nos a cobrar. Enquanto isso as empresas assinam contratos com o poder público e se oferecem pra “ajudar”. Ajudas caras e contratos longos.
Os empresários tomaram conta dos espaços que, outrora, nos pertenceram. E a Copa do Mundo é a grande desculpa deles pra fazer isso nas nossas barbas. O Araújo Vianna e as praças de Porto Alegre, há dez, quinze anos atrás, eram palco frequente de shows gratuitos. Hoje, a arte e a cultura estão sendo privatizadas. Os espaços que utilizavamos coletivamente, através de feiras, comícios, apresentações artísticas, agora servem somente como outdoor da Coca-Cola. A mensagem parece ser: “não se preocupem com arte, nós empresários a forneceremos no tempo e na medida certas”. Nossa capacidade de mobilização, a princípio, entalou-se em nossas gargantas. Perdemos os espaços, golpe após golpe, tanto da prefeitura quanto dos empresários. Sinto o cheiro de queimado do antigo e sinistro “relógio dos 500 anos da Rede Globo” que os portoalegrenses, em uma imensa demonstração de consciência popular e atitude coletiva, “purificaram” através do fogo. E vejo hoje sinais de que a luta atual não sairá barata para os empresários que mandam no Rio Grande do Sul. Quer uma pista de quem são estes empresários? Procure aqueles que volta e meia vão a Brasília oferecer jantares para a bancada gaúcha. São muitos os descontentes, e os mesmos estão mobilizados. Fora essas mobilizações que citei, temos outras mais organizadas como o Okupa Viaduto. E o Tom Zé hoje, chamando o pessoal a participar de um movimento chamado “Defesa Pública da Alegria”. Parabéns a todas elas.
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